29 de novembro de 2018

Nós, cuidadosos

"Por isso vos digo: não andeis cuidadosos quanto à vossa vida, pelo que haveis de comer ou pelo que haveis de beber; nem quanto ao vosso corpo, pelo que haveis de vestir. Não é a vida mais do que o mantimento, e o corpo mais do que o vestuário?" - Mateus 6:25

Para quem se ancora
no vil cais do agora
- ser bom é difícil.

Pois longo é o ofício
e distante a aurora
dos dias propícios.

Para quem namora
com a presente hora
- ser bom é difícil.

Pois a sede engorda
a fome de ceticismo
que o ansioso arvora.

A quem não agrada
observar os lírios
- ser bom é difícil.

Mas boa será a glória
que fará futuro o riso
de quem agora chora.

24 de novembro de 2018

À voz de muitas águas

"Seus pés reluziam como o metal, quando é refinado em fornalha ardente, e sua voz como o som de muitas águas." - Apocalipse 1:15

Tua voz de muitas águas
Teu amor que a tudo lava
envolveu o meu cansaço
quando até este cansaço
de mim já se cansava
e com Tua larga harmonia
a me guiar sobre rio calmo
me guardou daquelas pedras
que do leito se destacavam
fez nascer um regato claro
onde antes a sede habitava
fez brotar um consolo novo
das margens do meu corpo
a Tua voz de muitas águas

19 de novembro de 2018

Bordado

para Michele Marcial, na ocasião do nosso primeiro aniversário de namoro

A mulher que amo
está bordando.

Faz belos campos e grutas
os frutos com mais sumo
e as histórias da chuva
ela borda
muito mansa lá fora
aqui dentro
a própria chuva.

Enquanto desintegram-se as horas
eu vejo sorrir meu amor, que borda.

E quando ela borda uma flor
esta flor dá testemunho do sol
pela fala aroma de seu amor
sem palavras.

E quando ela borda o traço fino
e azul do rio, a água testemunha
os peixes e o fim da sede
pela azulesa do seu fio
sem palavras.

Mas eu não sendo flor
e sendo pouco rio
dela dou testemunho
com as palavras
sob o mesmo amor
desta tarde águas.

Enquanto desintegram-se as horas
eu vejo sorrir meu amor, que borda.

Porém, esta tarde águas
também está bordando
a mulher amada.