para Michele
Assim como esse azul
é próprio do céu de maio
eu sou teu, amor, e você
é minha
esposa relicário
feito o cheiro das flores
veste de cores os galhos
e informa que Deus
reconcilia em si
azuis noivados
27 de fevereiro de 2020
15 de fevereiro de 2020
Arqueiro
"Não terás medo do terror de noite nem da seta que voa de dia" - Salmos 91:5
As mãos tremem, a voz
é um fio de areia no vento.
À corda retesada, o arco
alinha-se ao alvo, dentro.
Que minhas mãos tremam
Senhor
mas não trema o pensamento.
Que esse arco oscile
mas a flecha chegue ao centro
do que queres que eu seja
sobre a rocha que és, sendo
o futuro da seta
Pai
o alvo em meu peito.
4 de fevereiro de 2020
Com quantas árvores se faz uma floresta?
Andando sob o sol do meio-dia
iam, pelo campo, dois irmãos.
Iam, um rapaz e sua irmãzinha,
buscando sombra fresca no sertão.
Ao verem, então, um cajueiro
perto do muro da velha escola
(enquanto suavam, vermelhos
no bafo quente daquela hora)
sentaram na sombra, felizes.
A menina sorriu e o moço disse
apoiando-se sobre a primavera:
"Essa árvore é uma floresta?"
Ao ouvir isso, ela se espantou.
"Floresta, irmão, é muito mais!
É cheia de bicho e tem tanta flor
que de contar a gente nem é capaz!"
O rapaz de novo questionou:
"E aquela família de canários
perto das flores, morando no galho?"
E ela: "Falta ainda mais cor".
"Então me diga: o que é esse lugar?"
o irmão falou, apontando o prédio
algo meio em ruínas e meio em tédios
do antigo grupo escolar.
"É uma escola...", a irmã sussurrou
com pouca certeza, só de ler no muro,
mas corrigiu a si mesma com ardor:
"Pra ser escola falta aluno!
E pra ter aluno, cadê o professor
e quem cozinhe e quem pinte a frente?
Pra ser escola falta coração de gente
secretária, auxiliar e diretor!"
Ela entendeu a pergunta do irmão
e seu olhar mudou em verdes mudas:
é com muitas gotas que se faz a chuva
que cria a colheita para muitas mãos.
iam, pelo campo, dois irmãos.
Iam, um rapaz e sua irmãzinha,
buscando sombra fresca no sertão.
Ao verem, então, um cajueiro
perto do muro da velha escola
(enquanto suavam, vermelhos
no bafo quente daquela hora)
sentaram na sombra, felizes.
A menina sorriu e o moço disse
apoiando-se sobre a primavera:
"Essa árvore é uma floresta?"
Ao ouvir isso, ela se espantou.
"Floresta, irmão, é muito mais!
É cheia de bicho e tem tanta flor
que de contar a gente nem é capaz!"
O rapaz de novo questionou:
"E aquela família de canários
perto das flores, morando no galho?"
E ela: "Falta ainda mais cor".
"Então me diga: o que é esse lugar?"
o irmão falou, apontando o prédio
algo meio em ruínas e meio em tédios
do antigo grupo escolar.
"É uma escola...", a irmã sussurrou
com pouca certeza, só de ler no muro,
mas corrigiu a si mesma com ardor:
"Pra ser escola falta aluno!
E pra ter aluno, cadê o professor
e quem cozinhe e quem pinte a frente?
Pra ser escola falta coração de gente
secretária, auxiliar e diretor!"
Ela entendeu a pergunta do irmão
e seu olhar mudou em verdes mudas:
é com muitas gotas que se faz a chuva
que cria a colheita para muitas mãos.
Escrevi esse poema ao esboçar um projeto para meus alunos, como estímulo para atividades que pretendo desenvolver com eles. Baseei a simplicidade desses versos em uma divagação exposta por Ortega Y Gasset em "Meditações do Quixote". Em tal obra, com palavras diversas das minhas, ele faz a pergunta que dá título ao meu texto.
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