5 de junho de 2025

Breves cartas aos ansiosos: carta 2, manhã

Cada manhã que nasce traz o mesmo sol sobre o mesmo planeta. Espremido entre o dia de ontem e o dia de amanhã, pouca novidade em si mesmo o novo dia traz.

De igual modo, todo diálogo novo é a continuação de uma conversa anterior e uma antessala para a conversa seguinte. Não entre as mesmas pessoas, necessariamente, nem sobre o mesmo assunto. Ainda assim, todo diálogo está no meio que é ter de um lado palavras já ditas e do outro lado palavras por dizer.

Há dois potenciais pesos sendo carregados em um diálogo, portanto. Primeiro, o medo do que antecedeu, talvez o receio de ter dito o que não devia ou o trauma de ter ouvido o que não queria. Segundo, a angústia pelo que virá, a desconfiança pelo amanhã, a expectativa de morrer antes de conseguir dizer o que se pretendia.

Estes dois pesos serão tão pesados quanto permitirmos, já que somos nós quem dimensionamos da memória aquilo que passou e do futuro aquilo que simulamos.

Das conversas e manhãs anteriores nada posso mudar, das conversas e manhãs posteriores nada posso saber. Aguardar, no presente, o triunfo de me importar apenas com o que controlo: acredito que aqui está a forma de dialogar com menos peso.

Porque, apesar de ser o mesmo sol sobre o mesmo planeta, todos os dias há novos bebês (embora haver bebês não seja novidade alguma) que crescerão a viverão novos amores e novos ódios que serão nomeados apenas em novos diálogos.

Afinal de contas, quem está com frio hoje não consegue se aquecer com o sol que fez ontem ou com o sol que fará amanhã. Aquecer-se com o sol de hoje, isto é, contentar-se com o diálogo presente, verdadeiramente aquece.